"Porque o ensaio, ainda que possa retirar grande parte da sua sedução do estilo elíptico ou metafórico, não pode ser um discurso cifrado. Nem se confunde com o fragmento. Nem participa do minimalismo atomizador da cultura mediática e política do nosso tempo: o ensaio, nas suas variantes mais livres, que, no limite, podem ir da crónica jornalística à reflexão de fundo, coloca-se, isso sim, na situação, única e instável, de ter de pensar o seu objecto - à partida qualquer objecto - de forma múltipla, no interior dessa barca onde todos vamos, mas de um ponto de vista que lhe é necessariamente exterior. Porque o ensaio, para sê-lo, ensaia, com a medida de tempo e de espaço que lhe convém, formas de escrita que o levam a pensar também de forma crítica e livre o próprio campo cultural que o gera."
" ... talvez as razões da fraca presença do ensaio se devam ao facto de ele ter uma clara propensão para germinar no espaço universitário, um húmus que, no entanto, se revela quase sempre incompatível com a disponibilidade e a libertação de normas, com a criatividade de pensamento em linguagem que é apanágio do ensaio."
João Barrento em "O Género Intranquilo - anatomia do ensaio e do fragmento"
Assírio & Alvim, Setembro de 2010
Páginas 79 e 80