segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

 
"Diz-se que a Índia pode fazer coisas estranhas à nossa mente, e eu posso confirmá-lo. Na Ásia fazia coisas que nunca sonharia fazer em Inglaterra. Como é que os utentes num comboio apinhado com destino a Londres reagiriam se eu, de repente, subisse pela janela ou me servisse, sem ser convidada, do saco cheio de batatas fritas de outra pessoa? Imaginem, no mesmo comboio em Londres, um homem de negócios a ler o seu jornal, um escudo que declara sem palavras: «Eu estou a manter erguida a minha barreira, The Times, já que não tenho qualquer desejo em falar com as pessoas que me rodeiam.» Qual seria a sua reacção se eu me levantasse do meu lugar oposto ao dele e, perentoriamente, removesse o escudo protector das suas mãos suspensas e, como se fosse a coisa mais natural do mundo, começasse a lê-lo? Ou o que faria o trabalhador de escritório sentado ao meu lado se eu lhe tirasse a caneta da mão com que escrevinhava apressadamente e a estudasse com um olhar de curiosidade intensa? Seria considerada, no mínimo, anti-social e, o pior, seria considerada doente mental.
As pessoas fazem esse tipo de coisa na Índia. O livro que eu estava a ler era-me arrancado das mãos e minuciosamente examinado com um fascínio extasiado. Ou a minha caneta era-me roubada enquanto eu estava a escrever no meu diário e a pessoa que ma tirava dizia:
- Memsahib, considero esta ser muito boa caneta do seu belo país natal a Inglaterra.
O meu próprio comportamento era igualmente bizarro. Eu entrava pelas cozinhas de um restaurante num barracão à beira da estrada e ajudava a cozinhar ou deambulava embrulhada no meu saco-cama ou, para escapar às multidões, trepava a uma árvore e lia o meu livro empoleirada como um abutre no ramo de cima, enquanto uma multidão de cabeças escuras fazia pequenas reverências curiosamente por debaixo de mim."
 
Josie Dew  em "Pelo Mundo em Bicicleta"

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