- Nick Cave: Acho, sim. E a certeza inflexível e cheia de si de algumas pessoas religiosas - e de alguns ateus, já agora - é algo que me desagrada. A soberba que há nisso. A santimónia. Deixa-me indiferente. Quanto mais declaradamente inabaláveis são as crenças de alguém, mais diminuídas parecem sair, uma vez que essas pessoas pararam de se questionar, e o não questionamento pode por vezes fazer-se acompanhar de uma atitude de superioridade moral. Um pouco de humildade não faria mal."
" Nick Cave: ... a beleza resplandecente e chocante do quotidiano é uma coisa para a qual eu procuro manter-me sempre alerta, nem que seja como um antídoto para o cinismo e o desencanto crónicos que parecem cercar tudo hoje em dia. Diz-me que, por muito desvirtuada ou corrupta que nos digam que a humanidade é e por muito degradado que o mundo se tenha tornado, esse mundo continua a ser belo. Nem poderia ser de outro modo."
" Nick Cave: ... talvez o sofrimento profundo possa ser considerado uma espécie de estado de exaltação no qual a pessoa que sofre se encontra o mais próximo que alguma vez irá estar da fundamental essência das coisas. Isto porque, ao sofreres, ganhas uma proximidade profunda com a ideia da mortalidade humana. Vais para um lugar muito escuro e experimentas na pele os extremos da tua própria dor - és levado aos limites mais extremados do sofrimento. Tanto quanto consigo perceber, existe um aspecto transformador inerente a este lugar do sofrimento. Somos fundamentalmente alterados ou refeitos por esse lugar. Atenção, todo esse processo é aterrorizador, mas a seu tempo acabas por regressar ao mundo com alguma espécie de conhecimento que terá algo que ver com a nossa vulnerabilidade enquanto participantes neste drama humano."
"Fé, Esperança e Carnificina" de Nick Cave e Séan O'Hagan
Relógio D'Água Editores, Novembro de 2022
Páginas 35, 42, 43 e 44
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