pelos colarinhos,
contra a parede, nas vielas,
é um mau encontro tardio,
vagamente armado
de garrafas partidas:
- O sentido ou a vida!,
gritas, frenético,
nunca pensaste que descerias
a tão radicais expedientes.
Mas olha para ti agora,
farto de bibliotecas,
dicionários, enganos
pagos
a preço de ouro; prometeram-te
o graal, a excalibur
ou pelo menos o rendimento
de uma oficina de escrita
criativa; deviam malhar todos
com os ossos na enxovia,
por muito menos apanharias
dez ou quinze anos
à sombra.
Daí esta esperinha, o recurso final
de que mediu versos, leu
as autoridades, prestou culto dominical
à polissemia do verbo.
Mas olhas nos olhos estas palavras
mudas,
nem sequer assustadas com
a tua súbita, tola
impaciência
nos punhos, nos caninos;
estas palavras impávidas,
sorrindo vagamente da tua fraca figura,
que ambiciona fortunas, pompas,
indemnizações,
e só agarra
sombras,
sobras."
"Purgatório" de Pedro Eiras
Assírio & Alvim
1ª edição, Maio de 2021
Páginas 56 e 57