terça-feira, 18 de janeiro de 2022

"Imagens Orientais / Imagens Acidentais" de Luísa Freire

 
LUÍSA FREIRE

Luz pela janela
onde a noite se consome
a brilhar o tempo.

Manhã de domingo -
o silêncio ajoelhado
ante a voz dos sinos.

De pé-ante-pé,
a noite desce plas coisas
em sombra-ante-sombra.

A manhã que acorda
espreguiça a luz recente
na terra que dorme.

À luz dos faróis,
a chuva sobre o asfalto:
salpicos de estrelas.

Na noite profunda
bate o silêncio estrelado.
Quantas badaladas?

Canto alentejano:
tisnados, hirtos, solenes,
os deuses da terra.

Fim de tarde e água:
nuvens a nadar de costas
na calma da ria.

Colher a imagem
e colocá-la entre folhas -
um livro de instantes!

Sabor esquecido:
gosto que traz a infância
na ponta da colher.




"Imagens Orientais / Imagens Acidentais" de Luísa Freire
Assírio & Alvim, Novembro de 2003

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