O Paleoceno o Eoceno
o Mioceno o Pleistoceno
e eis-nos agora aqui: o Plasticeno.
Olha, uma rocha feita de areia
e uma de cal, e uma de quartzo,
e uma de o que é isto?
É preto e listrado e escorregadio,
não exactamente uma pedra
nem uma não-pedra.
Na praia pelo menos.
Óleo petrificado, com uma veia escarlate,
parte de um balde talvez.
Quando desaparecermos e os alienígenas chegarem
para decifrar os nossos fósseis:
será isto um testemunho?
De nós: da nossa tão breve história,
da nossa inteligência, da nossa negligência,
da nossa morte repentina?
2. Débeis esperanças
Poderias transformá-lo em óleo
fervendo-o: isso já foi feito.
Primeiro terias de o apanhar.
Haveria também o cheiro.
Alguns supermercados proibiram-no.
Também as palhinhas.
Talvez venha a haver um imposto
ou outras leis.
Há micróbios que o comem -
já foram descobertos.
Mas a temperatura tem de ser alta:
não aplicável ao mar do Norte.
Podes prensá-lo a imitar madeira
mas somente alguns tipos.
E em blocos para construção, também.
Podes colhê-lo dos rios
antes que chegue ao mar.
Mas e depois? O que fazes com ele?
Com o avassalador, contínuo
infindável derramamento?
3. Folhagem
«um pedaço de plástico preto - a folhagem que define a era do petróleo»
Mark Cocker, Our Plate
Brota por todo o lado, esta folhagem.
Do alto das árvores, como visco,
ou presa nos pântanos
ou florescendo em lagoas como nenúfares,
ataviada e ostensiva,
ondulando como se estivesse viva
ou dando às praias, neo-algas
de sacos rasgados, embalagens descartadas, corda emaranhada
retalhada por rochas e marés.
Mas ao contrário da folhagem verdadeira não tem raízes
e não dá nada em troca,
uma caloria vazia sequer.
Quem a planta, esta inútil safra?
Quem a colhe?
Quem poderá dizer Basta?"
"Afectuosamente" de Margaret Atwood
Bertrand Editora
1ª Edição, Julho de 2021
Páginas 167, 169 e 171
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