sábado, 4 de janeiro de 2020

Mensagem Às Estátuas

"Vocês, pedras
violentamente deformadas,
destruídas
pelo exacto golpe do cinzel,
hão-de exibir ainda por muitos séculos
o último perfil que em vós deixaram:
seios imperturbáveis por um suspiro,
firmes
pernas que ignoram o cansaço,
músculos
tensos
no seu esforço inútil,
cabeleiras que o vento
não despenteia,
olhos abertos que repelem a luz.
Porém,
a vossa arrogância
imóvel, a vossa fria
beleza,
a desdenhosa fé do imutável
gesto, hão-de morrer
um dia.
O tempo é mais tenaz.
A terra também
espera por vós.
Nela hão-de cair ao vosso peso,
hão-de ser,
se não cinzas,
ruínas,
pó, e a vossa
sonhada eternidade será o nada.
À pedra tornarão sendo pedra,
indiferente mineral, afundado
escombro,
depois de viverem o duro, ilustre,
solene, vitorioso, equestre sonho
de uma glória erigida à memória
de algo disperso também em esquecimento."


"Para Que Eu Me Chame Ángel González - Uma antologia"
Língua Morta, Outubro de 2018
Páginas 69 e 70

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