quinta-feira, 27 de maio de 2021

 
"O portão senhorial do Parque, aberto diante de nós, oferece-nos os tesouros sombrios do seu jardim florido. Faz-se mais denso aqui o arvoredo, sobe mais alto o perfil esgalhado das araucárias, é mais profundo o silêncio, onde um estranho mistério paira e se intensifica. Cerca-nos um ambiente de floresta encantada. Por todos os lados se abrem risos vermelhos de begónias. O verde tenro das avencas e dos fetos cresce na orla húmida das fontes, onde a água canta a melopeia eterna do seu fluxo inesgotável. Ao longo das ruas ensaibradas, cómodos brancos oferecem de onde em onde um repouso destinado a embalar na alma do caminhante a tendência lírica para o sonho.
É assim num ambiente destes que apetece parar a desfolhar a flor suave da recordação. Olha-se então para trás e pensa-se nas inúmeras coisas perdidas para lá das horas queimadas que se não refazem - essas doces coisas que deixámos perder na nossa vida sem compreendermos o encanto de viver que com ela nos fugia ...
O Parque estende a rama dos seus arvoredos até à estrada que, pela parte de baixo da fonte da Sabuga desce do Arrabalde para a Vila, terminando na sua confluência com a do Duche, onde se encontra o palácio Valenças ..."



"Roteiro Lírico de Sintra" de Oliva Guerra
Escola Tipográfica das Oficinas de S. José de Lisboa, 1940
Páginas 14 e 15

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