Uma grande folha de água.
Sem vertigens, mergulhamos na materna espessura de um paraíso vegetal. Toda a densidade do obscuro mundo animal se resolveu na paciência forte e suave de uma terna e acolhedora superfície arborescente que nos envolve na sensual flexuosidade dos seus ramos robustos, linhas determinadas, completas e compactas na sua generosa amplitude de promessa que em folhas, frutos, flores, mantém a integridade da energia única que as compõe e as conduz ao seu termo último.
É a metamorfose de uma flora abolindo a fronteira entre o terrestre e o aquático, é o mar e a floresta, é a amorosa e firme direcção do desejo incandescente que encontra o limite da forma terminal e se manifesta na pujante plenitude do compacto, a energia viva visível em toda a sua extensão, como se todo o impulso criador se configurasse no limite máximo da fixação, da imobilidade.
Uma flora iridiscente mas cálida, paciente e impetuosa.
como o rio do pulso que a rasga
como a seiva das veias harmoniosas
árvore marinha
liberta em volutas e espirais
com ramos densos como lâmpadas,
delicadeza vegetal, aquática,
dança navegada.
A grande folha verde olha-nos liberta das suas profundezas."
António Ramos Rosa em "Obra Poética I"
Assírio & Alvim
1ª edição, Setembro de 2018
Página 699
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