domingo, 31 de maio de 2020

O Homem e o Mar

"Homem livre, tu sempre adorarás o mar!
O mar é o teu espelho; a tua alma contemplas
Na sua ondulação, no infinito vaivém,
E o teu espírito é fosso não menos amargo.

Gostas de mergulhar na tua própria imagem;
Chegas mesmo a beijá-la, e o teu coração
Distrai-se algumas vezes do seu próprio som
Com o rumor dessa queixa indomável, selvagem.

Sois ambos, afinal, discretos, tenebrosos:
Homem, ninguém sondou os teus fundos abismos;
Ó mar, ninguém conhece os teus tesouros íntimos,
Tanto que sois dos vossos segredos ciosos!

E porém, desde sempre, há séculos inumeráveis,
Que os dois vos combateis sem piedade ou remorso,
De tal modo gostais da carnagem, da morte,
Ó lutadores eternos, irmãos implacáveis!"



"As Flores Do Mal" de Baudelaire
Assírio & Alvim, Outubro de 1998
Páginas 75

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