Percorrer caminhos antigos com pés emprestados
Entrar em bosques e jardins proibidos
Como quem entra na alma de alguém
Sentir coisas muito verdes e húmidas
Debaixo das árvores
Beijos. Murmúrios. Passos e risos
Mulheres esfíngicas e medievais
É possível caminhar com pés de monjas que não amaram
E de rainhas que se dedicaram a inventar milagres
Com rosas e piedosas vozes
É possível fundar conventos desobedientes e dissidentes
Na margem esquerda de um rio
Errada. Errante. Alagada
E tentar resgatá-los continuamente
É possível olhar a cidade com olhos fossilizados no tempo
Com olhos estrangeiros de Inês e de Isabel
E compreender o mesmo
Ver os seus amanheceres degolados e os seus entardeceres cheios de conspiração
Dourados e efémeros
Com torres e muralhas erguidas
Com palácios legítimos e ilegítimos
E o casario branco com muita gente alinhada lá dentro
Desalinhada connosco
É possível vestir vestidos compridos e feudais
Bastardos e de azul real
Ajustarem-se ao nosso corpo em esperas inúteis nas ruínas dos claustros."
"Roupão Azul" de Ana Paula Jardim
Guerra & Paz Editores
1ª Edição, Janeiro de 2021
Páginas 74 e 75
Sem comentários:
Enviar um comentário