perguntas-me
e eu respondo-te
querida deusa
sim
é disto que eu gosto
de ser o teu primeiro animal nocturno
de caminhar entre as nuvens da madrugada
pelas ruas desertas
quando o vento açoiteia as folhas de outono
sim
gosto de ser espreitada pelos espíritos da montanha
ocultos nos seus tronos de muros e heras
enquanto eu cantarolo
passando sem temor
sobre o chão molhado pelas lágrimas de uma princesa de névoa
sim
gosto do meu jardim selvagem e das rosas
que se abrem na madrugada para contemplarem diana
banhada pelo luar do solstício de inverno
como na pintura de uma fada do jardim epicureano
sim
gosto deste silêncio e deste assombro só para mim
de ouvir as vozes dos anjos que em coro celebram
num templo perdido no bosque sagrado
meu destino de ser o poeta das tuas luas
ó sintra azul-lunar
gosto também meu irmão
sim
da tua mística luz eterna
de ti
que escreveste no aparente silêncio das pedras
a dor escultural da tua busca interior
por um diálogo entre o homem
deus
e a natureza
sim
confesso
gosto das coisas que vivem na penumbra
deste aprender contigo deusa querida
que a vida não acaba com a mera morte
e que o eco das palavras nos teus ventos circulares
ressoará em todas as estações
no ouvido atento do jovem coração
e suas naturais sezões
adianto mesmo amor
sim
que dentro de ti serei eterno
como a aura que circunda teu rosto verde
e se revela sem mácula ao luar
quando te abraço
no leito aberto das
eras e lembranças escritas no teu corpo."
"Selenographia in Cynthia" de Jorge Telles de Menezes
Hugin Editores
1ª Edição, Agosto de 2003
Páginas 33 e 34
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