segunda-feira, 9 de outubro de 2023

"Obra Poética II" de António Ramos Rosa (VI)

 "Vejo o teu rosto quotidiano
como se a penumbra
tivesse olhos
ou como se as raízes pudessem ver
através da sombra

Estou no húmus da casa
no húmus do silêncio
e vejo através das vértebras
de uma luz subterrânea
o teu rosto de terra

Há sempre muros e muros
e o nevoeiro dos dias
mas tu és uma chama
sobre a mesa posta

Vem a noite e as serpentes
envolvem as lâmpadas
e reduzem o espaço
Cada um procura
na palma das mãos
os grãos verdes do mar
O monstro vago da noite
desfoca o nosso olhar
e os joelhos vacilam
O teu rosto persiste
como se o teu torso fosse
o tronco de uma árvore"



António Ramos Rosa em "Obra Poética II"
Assírio & Alvim
1ª edição, Outubro de 2020
Páginas 577 e 578

Sem comentários:

Enviar um comentário