sexta-feira, 28 de maio de 2021

 "Há, porém, qualquer coisa que, felizmente, não foi atingida pelas realizações arquitectónicas dos promotores do seu progresso. Refiro-me a um paredão feito da própria penedia, orlado por uma simples balaustrada sobranceira às ondas, construído à entrada das Azenhas do Mar e donde os nossos olhos podem estender-se sobre o largo.
A perspectiva é tão erma e tão grandiosa que chega a ser perturbadora. Dir-se-ia uma varanda sobre o Infinito. Apenas céu e oceano. Entre os azuis religiosos das duas imensidades, insensivelmente a alma desprende-se-nos dos pequenos nadas da vida quotidiana. As nossas ambições, as nossas vaidades, as nossas querelas, tudo é tão pequeno, tudo tão inútil, tão insignificante em face daquele deserto insondável, daquela cúpula profunda e sem limites ... Diante de nós alargam-se os horizontes e naquela solidão onde anda suspensa uma interrogação eterna, como que nos sentimos a sós com o nosso próprio destino.
Perto desce a povoação das Azenhas do Mar em coleados pitorescos até à beira da água formando um promontoriozinho que avança sobre o mar num recorte mais saliente da costa."



"Roteiro Lírico de Sintra" de Oliva Guerra
Escola Tipográfica das Oficinas de S. José de Lisboa, 1940
Página 69

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