segunda-feira, 4 de outubro de 2021

 
"Mencionámos de passagem o tema da solidão. Ser poeta significa assumir uma forma de solidão?
Sem dúvida, mas assumir também uma forma de companhia. Porque não se trata da solidão como isolamento, nem como separação, nem como falta de presença. Trata-se, sim, da solidão do homem só, no sentido de um fazer e viver único que, por outro lado exige concentração, silêncio, contemplação do mais íntimo de si mesmo. Mas, por outro lado, ocorre-me que não existe forma mais plena de comunhão, de sentir a existência do outro. Porque geralmente o artista está só. Mas pensemos no pintor e em como o devem acompanhar a cor, as linhas, as formas. Como o mundo acompanha o poeta, o seu reconhecimento do homem, embora, por vezes, não o entendam ou escutem. Há outra forma de viver: é a companhia que significa a intimidade com o mundo que dá origem à linguagem da criação. Penso que no poeta mais solitário, mais separado, mais isolado, está presente toda a humanidade, toda a realidade, embora não o sinta quando em angústia, e sofra essa falta de comunicação circunstancial, aleatória, com o meio que o rodeia. Por isso é tão importante cultivar o que chamamos de solidão, mas não como singularidade irredutível, mas como o fazer do sapador que se encontra, por baixo ou nem sei por onde, com todas as coisas. A poesia, e a arte em geral, exige muita dor, muito sacrifício, uma grande quota de incompreensão, de marginalidade acidental, mas que finalmente, sem dúvida que é algo infinitamente consolador e acompanha mais que qualquer outra coisa. A arte não é uma debilidade. É uma força, embora aniquile quem a pratica."




"Poesia e Criação: Diálogos com Guillermo Boido - Vol I" de Roberto Juarroz
Edições Sr Teste, Agosto de 2020
Páginas 72 e 73

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